Antes de adentrar na temática principal, faz-se necessária uma breve explicação sobre as possibilidades de recolhimentos para o INSS e quais são os requisitos para a concessão da Aposentadoria por Tempo de Contribuição.
Após as devidas explanações, será possível abordar a utilização ou inutilização dos recolhimentos realizados na condição de contribuinte individual – MEI na contagem de tempo para a modalidade de aposentadoria supracitada.
- DO SEGURADO FACULTATIVO E OBRIGATÓRIO
As contribuições são de suma importância para que os segurados possam receber os benefícios previdenciários, incluindo a concessão de aposentadoria.
Os recolhimentos realizados para o INSS podem ser feitos na condição de contribuinte facultativo ou contribuinte obrigatório, sendo que ambos diferenciam-se quando o contribuinte recebe remuneração pela atividade exercida.
De forma sucinta, isso significa que, a partir do momento em que há recebimento de remuneração, não há mais que se falar em contribuinte facultativo, pois com a remuneração nasce a obrigatoriedade de realizar os pagamentos para a Autarquia Federal. Logo, enquanto não há remuneração, a contribuição é facultativa; contudo, se há trabalho remunerado, as contribuições serão obrigatórias.
Ademais, cumpre esclarecer que os contribuintes obrigatórios podem ser divididos em cinco categorias: empregado, empregado doméstico, trabalhador avulso, segurado especial e contribuinte individual. É oportuno indicar que o MEI (microempreendedor individual) é uma espécie de contribuinte individual “especial”.
Diante do exposto, menciona-se que o presente artigo tem como intuito demonstrar quando os recolhimentos realizados na condição de contribuinte individual MEI serão ou não compatíveis com a Aposentadoria por Tempo de Contribuição. Por isso, previamente, serão contextualizados os requisitos para pleitear referida aposentadoria.
- DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
O ponto fundamental para a verificação da Aposentadoria por Tempo de Contribuição (APTC), conforme o próprio nome já indica, é a análise das contribuições vertidas ao INSS.
Referida aposentadoria tinha determinados requisitos, os quais foram alterados após a reforma previdenciária advinda da Emenda Constitucional nº 103/2019. Os requisitos anteriores à Emenda Constitucional eram os seguintes:
- Mulher: tempo mínimo de 30 anos de contribuição;
- Homem: tempo mínimo de 35 anos de contribuição.
Por outro lado, após a Emenda, e com as devidas mudanças, também surgiram as regras de transição para a Aposentadoria por Tempo de Contribuição, visando não prejudicar drasticamente os segurados que já recolhiam antes de 2019. Por conseguinte, foram estabelecidas as seguintes regras de transição:
- Aposentadoria por Tempo de Contribuição + Idade mínima;
- Aposentadoria por Tempo de Contribuição Pedágio de 50%;
- Aposentadoria por Tempo de Contribuição Pedágio de 100%;
- Aposentadoria por Tempo pela Regra dos Pontos.
Conforme exposto, na referida aposentadoria, o que mais se destaca é o “tempo de contribuição”. Entretanto, não são todas as contribuições devidamente pagas ao INSS que serão consideradas no momento da análise do pedido de Aposentadoria por Tempo de Contribuição.
- DO CONTRIBUINTE INDIVIDUAL – MEI (MICROEMPREENDEDOR INDIVIDUAL) E A APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
Conforme já exposto, o MEI (Microempreendedor Individual) trata-se de contribuinte obrigatório individual, e tem tópico próprio, eis que foi a modalidade de segurado obrigatório escolhida para correlacionar com a Aposentadoria por Tempo de Contribuição, tendo em vista que referido segurado pode não fazer jus à Aposentadoria por Tempo de Contribuição.
O MEI é considerado um “contribuinte individual especial”, pois, embora seja um contribuinte individual, é tratado de forma diferenciada. Uma das diferenças que podem ser destacadas é o fato de que o contribuinte individual possui data de vencimento para pagamento da contribuição até o dia 15 de cada mês, enquanto o MEI possui uma data de vencimento distinta, podendo realizar o pagamento até o dia 20.
Além da data de vencimento ser diferente, é importante ressaltar a diferenciação da alíquota de recolhimento. O INSS permite que o contribuinte individual MEI realize o pagamento de contribuição pela alíquota de 5%.
Nota-se que o MEI, além de possuir data de vencimento diferenciada, também tem a menor contribuição vertida para o INSS, sendo, portanto, o contribuinte que possui o pagamento pela alíquota reduzida de 5%, como se fosse um contribuinte na condição de “baixa renda”; porém, o percentual escolhido pode definir a possibilidade ou não de se aposentar pela APTC.
- DA INCOMPATIBILIDADE DOS RECOLHIMENTOS REALIZADOS NA CONDIÇÃO DE CONTRIBUINTE INDIVIDUAL – MEI E A INUTILIZAÇÃO NA CONTAGEM DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO PARA A APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
Conforme mencionado, o MEI tem tratamento diferenciado e, em razão dos recolhimentos serem feitos em percentual reduzido, o segurado deve estar ciente de que não fará jus à aposentadoria por tempo de contribuição, salvo se realizada a complementação do valor até o alcance da alíquota de 20% do salário mínimo.
Cumpre esclarecer que a incompatibilidade dos recolhimentos realizados na condição de contribuinte individual – MEI no percentual de 5% do salário mínimo e a consequente inutilização na contagem de tempo de contribuição para a aposentadoria por tempo de contribuição encontra previsão no artigo 21, § 3º, alínea “a” da Lei 8.212/91. Note:
Art. 21. A alíquota de contribuição dos segurados contribuinte individual e facultativo será de vinte por cento sobre o respectivo salário-de-contribuição.
§ 2o No caso de opção pela exclusão do direito ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a alíquota de contribuição incidente sobre o limite mínimo mensal do salário de contribuição será de: (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
I – 11% (onze por cento), no caso do segurado contribuinte individual, ressalvado o disposto no inciso II, que trabalhe por conta própria, sem relação de trabalho com empresa ou equiparado e do segurado facultativo, observado o disposto na alínea b do inciso II deste parágrafo; (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
II – 5% (cinco por cento): (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
a) no caso do microempreendedor individual, de que trata o art. 18-A da Lei Complementar no 123, de 14 de dezembro de 2006; (grifos acrescidos)
Extrai-se que os recolhimentos realizados pelo microempreendedor individual resultam na exclusão do direito à aposentadoria por tempo de contribuição, de modo que os recolhimentos do MEI não serão aproveitados na contagem de tempo para a APTC, mas contarão normalmente para a concessão da aposentadoria por idade ou para os demais benefícios concedidos pela Autarquia Previdenciária.
Diante do exposto, deve ser tomado o cuidado necessário para a demanda pleiteada, pois se anteriormente o segurado realizou os recolhimentos no percentual reduzido com o intuito de pleitear uma APTC, deve ser orientado de que referido benefício não será concedido, salvo se devidamente realizado o pagamento da guia de complementação para alcance das contribuições até o percentual de 20% do salário mínimo.
- DA COMPLEMENTAÇÃO DOS RECOLHIMENTOS PARA O ALCANCE DO PERCENTUAL DE 20%
No tópico supracitado, ficou devidamente demonstrado que as contribuições que foram realizadas na condição de contribuinte individual – MEI não serão utilizadas na contagem de tempo de contribuição para a Aposentadoria por Tempo de Contribuição (APTC).
Entretanto, o segurado que realizou referidas contribuições não deve se desesperar, pois ainda há possibilidade de reaproveitar os recolhimentos, desde que haja a complementação do valor pago para o alcance da alíquota de 20%, nos termos do artigo 21, § 3º da Lei 8.212/91, o qual dispõe que:
[…]
§ 3o O segurado que tenha contribuído na forma do § 2o deste artigo e pretenda contar o tempo de contribuição correspondente para fins de obtenção da aposentadoria por tempo de contribuição ou da contagem recíproca do tempo de contribuição a que se refere o art. 94 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, deverá complementar a contribuição mensal mediante recolhimento, sobre o valor correspondente ao limite mínimo mensal do salário-de-contribuição em vigor na competência a ser complementada, da diferença entre o percentual pago e o de 20% (vinte por cento), acrescido dos juros moratórios de que trata o § 3o do art. 5o da Lei no 9.430, de 27 de dezembro de 1996. (grifos acrescidos)
Em que pese a complementação seja possível, deve ser analisada a pertinência de complementação, haja vista que ao gerar a guia de contribuição complementar, incidirá o valor da diferença até o alcance do percentual dos 20%, bem como juros e multa.
Logo, orienta-se que o segurado interessado em reaproveitar os recolhimentos realizados como MEI realize uma simulação sobre eventual valor a ser pago a título de complementação. Isso se deve ao fato de que as alterações trazidas pela Reforma da Previdência, com a Emenda Constitucional nº 103/2019, podem resultar na ausência de vantagem ao complementar, ou seja, pode não compensar financeiramente o valor despendido para o alcance da alíquota de 20%.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, não se pode afirmar por completo que os recolhimentos realizados como MEI impedirão a Aposentadoria por Tempo de Contribuição. O que de fato se verifica é que os recolhimentos realizados na condição de microempreendedor individual podem não ser utilizados na contagem de tempo de contribuição se foram realizados sem a devida complementação do valor pago.
Por outro lado, caso haja a complementação dos pagamentos realizados para a alíquota de 20% o segurado poderá fazer jus à Aposentadoria por Tempo de Contribuição.
Por fim, conclui-se que, antes de tomar a decisão de realizar ou não a complementação da guia na condição de MEI, é primordial fazer uma análise minuciosa para verificar se, no caso concreto, compensa realizar a complementação e se a antecipação do pedido é mais vantajosa. Caso contrário, na ausência de vantagem, o ideal é aguardar a aposentadoria por idade programada.
REFERÊNCIAS
BRASIL. LEI Nº 8.213, DE 24 DE JULHO DE 1991. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8213cons.htm. Acesso em: 18 de maio de 2024.
BRASIL. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 103, DE 12 DE NOVEMBRO DE 2019. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc103.htm#art1. Acesso em: 18 de maio 2024.
GOV.BR. SOLICITAR APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. Disponível em: https://www.gov.br/pt-br/servicos/solicitar-aposentadoria-por-tempo-de-contribuicao Acesso em: Acesso em: 18 de maio de 2024.
GOV.BR. O QUE VOCÊ PRECISA SABER SOBRE A APOSENTADORIA DO MEI. Disponível em: https://www.gov.br/inss/pt-br/assuntos/o-que-voce-precisa-saber-sobre-a-aposentadoria-do-mei. Acesso em: Acesso em: 18 de maio de 2024.
Elaborado por:
Ana Júlia de Moraes
OAB/SP 496.331
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