DIREITO AO ESQUECIMENTO: OPOSIÇÃO ENTRE A PRIVACIDADE E A LIBERDADE DO INDIVÍDUO

DIREITO AO ESQUECIMENTO: OPOSIÇÃO ENTRE A PRIVACIDADE E A LIBERDADE DO INDIVÍDUO

1. INTRODUÇÃO

O direito ao esquecimento consiste em questões complexas relacionadas à privacidade, liberdade de expressão, dignidade e honra, é o direito que uma pessoa tem de não permitir que um fato, que possa lhe causar constrangimento, ainda que verídico, seja exposto para o público em geral.

O direito ao esquecimento também é conhecido por outras nomenclaturas como: “direito de ser deixado em paz” ou o “direito de estar só”.

O tema aqui abordado, ao contrário do que muitos pensam, é um assunto antigo, já aparecendo há décadas nos casos e decisões judiciais de outros países, porém, com o crescimento e expansão das informações via internet, o debate voltou a ser pauta concreta no cenário jurídico nos últimos anos.

Observa-se que, com o avanço das mídias sociais e a expansão da internet, o direito ao esquecimento tem gerado inúmeros embates jurídicos e diversos são os entendimentos e discussões acerca do tema.

Neste artigo, exploraremos o conceito do direito ao esquecimento, seus desafios, implicações legais e críticas.

2. O QUE É DIREITO AO ESQUECIMENTO?

Atualmente, com o avanço das redes sociais e com o amplo acesso da sociedade no mundo digital, as relações sociais parecem também migrar para o mundo virtual. Assim, com os diversos canais de comunicação para criação e manipulação de dados, a informação pode ainda ser propagada por diversas pessoas, de diversos lugares.

O direito ao esquecimento é um conceito legal que reconhece o direito de um indivíduo de ter informações pessoais relevantes ou prejudiciais, removidas de fontes públicas, especialmente da internet.

O debate gira em torno da pessoa afetada pela informação ter o poder de solicitar a remoção de conteúdo indesejado da internet, sob o argumento de que, muitas vezes, a informação vinculada nas redes prejudica a honra e privacidade do indivíduo, gerando graves prejuízos em sua vida pessoal e profissional.

Assim, no mundo digital em que vivemos, com a rapidez que as informações são divulgadas e compartilhadas, os dados são expandidos para toda a rede mundial de computadores e se disseminam por anos na web, podendo ser encontradas a qualquer tempo.

A internet tem a facilidade de acumular e eternizar informações, que muitas vezes podem prejudicar as pessoas e sua vida em sociedade.

Atualmente, conforme veremos a seguir, são diversos os entendimentos e discussões acerca do tema, mas o ideal é sempre realizar uma análise concreta de caso para caso.

No Tema 786 do STF, foi firmada a tese: 

“É incompatível com a Constituição a ideia de um direito ao esquecimento, assim entendido como o poder de obstar, em razão da passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos e licitamente obtidos e publicados em meios de comunicação social analógicos ou digitais. Eventuais excessos ou abusos no exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a caso, a partir dos parâmetros constitucionais – especialmente os relativos à proteção da honra, da imagem, da privacidade e da personalidade em geral – e as expressas e específicas previsões legais nos âmbitos penal e cível.”

Consoante entendimento do STF, o direito ao esquecimento é incompatível com a Constituição Federal, não podendo “apagar” do tempo fatos ou dados verídicos publicados em meios de comunicação.

Como é um tema com grande repercussão midiática, existem diversos pensamentos e pontos de divergência no tema em análise, principalmente quanto ao conflito entre a liberdade de expressão e as individualidades do ser humano, como a intimidade e privacidade, conforme veremos no tópico a seguir.

Vale mencionar que não existe uma previsão legal expressa ao direito ao esquecimento, relacionando-se ao direito à vida privada, intimidade e dignidade da pessoa humana, todos constantes do art. 5º, X da CF, não havendo lei própria que versa sobre o tema.

3. CRÍTICAS AO TEMA – DIREITO AO ESQUECIMENTO

Como na maioria das demandas no âmbito do direito existem opiniões diversas, no caso aqui discutido também existem críticas, mesmo com inúmeras decisões judiciais reconhecendo o direito ao esquecimento no país.

Alguns doutrinadores criticam a existência de um direito ao esquecimento, pois isso pode atrapalhar a divulgação da liberdade de expressão da imprensa, podendo sair da mídia/internet informações que são contundentes com a realidade, e que, por vezes, são de interesse de toda a sociedade.

Outro ponto abordado pelos críticos sobre o tema, é a facilidade com que o direito ao esquecimento teria de fazer desaparecer informações sobre crimes graves, que estão presentes na história da sociedade e geraram grande repercussão e comoção social.

Assim, sem dúvida, o principal ponto de conflito quanto ao direito ao esquecimento está justamente em tentar conciliar o direito de liberdade de expressão com o direito à informação. 

4. CASO DA APRESENTADORA XUXA MENEGHEL 

Um dos casos mais famosos para análise ao direito ao esquecimento é o da apresentadora Xuxa Meneghel, que no passado protagonizou um filme do qual se arrependeu de algumas cenas e não queria que fosse exibido ou lembrado, por lhe causar prejuízos profissionais e transtornos pessoais.

A apresentadora em questão tem uma vida pública, seus trabalhos são públicos e sempre teve sua vida/intimidade exposta nas redes e televisão, porém, teve sua honra e moral prejudicada pela exposição no filme.

Assim, tendo em vista que a internet é um meio de propagação eterna de informações, dados e imagens, a apresentadora moveu uma ação contra a Google Brasil e tinha como objetivo a retirada de resultados de pesquisa que a ligassem ao filme e que vinculassem sua imagem à prática de pedofilia.

A decisão de primeiro grau foi favorável à apresentadora Xuxa Meneghel, determinando que o Google não apresentasse mais resultados de pesquisa que vinculassem Xuxa à prática de pedofilia que ficou demonstrada no filme. Porém, a decisão foi reformada pelo STJ, sob o argumento de que os provedores de pesquisa não podem ser obrigados a retirar da web resultados de busca.

Dessa forma, a apresentadora buscava ter o direito ao esquecimento reconhecido, por um fato que ocorreu há décadas, porém o STJ entendeu que não há motivação suficiente para barrar o interesse coletivo e o direito ao acesso à informação, não sendo aplicável ao episódio o direito ao esquecimento.

5. DIREITO AO ESQUECIMENTO E APLICAÇÃO PENAL

Outro ponto que merece destaque é direito ao esquecimento e a aplicação no âmbito do direito penal.

Inicialmente, surgiu o tema do direito ao esquecimento para ex-condenados, que após cumprirem toda a pena imposta, desejavam ter seus antecedentes “apagados”, para que não fossem mais expostos perante a sociedade.

Porém, quando se fala de questões penais, o foco é a investigação e a punição dos crimes, e as informações são mantidas em registros oficiais, não tendo o que se falar de aplicação do direito ao esquecimento no âmbito do direito penal.  

Atualmente, conforme já abordado no presente artigo, a discussão sobre o direito ao esquecimento foi ampliada e gira em torno de outros aspectos da vida e da sociedade.

6. CONCLUSÃO

Diante do apresentado, é possível perceber pontos de vista diferentes e um debate aguçado em relação ao tema.

Entende-se que a retirada de dados das redes poderia ferir a liberdade da imprensa e o direito da sociedade de ter acesso à questões impactantes, impedindo a livre circulação de informações, podendo levar a uma repressão ao direito de liberdade.

Entretanto, deve-se considerar as implicações negativas causadas na vida particular de cada indivíduo afetado pelas informações “jogadas” nas redes, que podem comprometer carreiras e denegrir a personalidade dos particulares.

Assim, no tocante ao direito ao esquecimento, deve ser analisado pelos julgadores caso a caso, verificando sempre as circunstâncias da realidade fática e os possíveis danos ocorridos aos direitos constitucionais individuais (honra, vida privada, intimidade), e se de fato são justificados pelo direito à liberdade de expressão e informação.

O recente entendimento do STF é pela inconstitucionalidade do direito ao esquecimento, porém, apesar do julgado, entende-se que o Brasil não desconsiderou sua aplicação, continuando a análise caso a caso, a fim de possibilitar eventual reconhecimento do direito ao esquecimento no futuro.

Dessa forma, em um mundo cada vez mais virtual, onde as informações se espalham com grande facilidade, o direito ao esquecimento desempenha um papel fundamental na preservação da privacidade de cada indivíduo, sendo um tema relevante para a sociedade atual.

BIBLIOGRAFIA

Disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/08032022-Direito-ao-esquecimento-nao-justifica-obrigacao-de-excluir-noticia-de-site–decide-Terceira-Turma.aspx#:~:text=Direito%20ao%20esquecimento%20incompat%C3%ADvel%20com%20a%20Constitui%C3%A7%C3%A3o&text=Todavia%2C%20a%20ministra%20observou%20que,o%20entendimento%20firmado%20pelo%20STJ. (Acesso em 12/09/2023)

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/o-que-consiste-o-direito-ao-esquecimento/319988819 (Acesso em 12/09/2023)

Disponível em: https://politize.com.br/o-que-e-o-direito-ao-esquecimento/ (Acesso em 19/09/2023)

Disponível em: https://www.conjur.com.br/2021-mar-08/opiniao-direito-esquecimento-superinformacao (Acesso em 19/09/2023)

Disponível em: https://www.dizerodireito.com.br/2013/11/direito-ao-esquecimento.html (Acesso em 25/09/2023)

Por Maria Tereza Benedeti

OAB/SP 461.157

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